terça-feira, 9 de dezembro de 2014

A CULPA NÃO É MINHA!


- Isso que você está fazendo comigo, outra pessoa vai vir e fazer a mesma coisa com você.
- Já fizeram. Inúmeras vezes. Me deseja outra coisa, que essa virou tradição já.
- Engraçado, você não era assim ontem.
- Assim como? Idiota?
- Você acha idiotice gostar de alguém?
- Como você definiria uma coisa que te transforma num completo babaca?
- Humano.
- Um humano idiota, que seja.
- Tá, se você quer assim, eu vou desligar, não tenho porque estar perdendo tempo contigo.
- Eu sei que você vai me odiar, mas a culpa não é minha.
- Quem está me dando um fora é você, então minha é que não seria.
- Ninguém pode obrigar ninguém a sentir qualquer coisa que seja.
- Mas você não se permite, esse é o problema. Permita-se. Melhor: Permita-me.
- Agora que eu arrumei toda a casa? Não mesmo.
- A gente nunca sabe quem vai bagunçar a nossa vida, ou quem vai nos ajudar a manter tudo organizado, Caio.
- Desculpa, mas é um risco que eu não vou e nem quero correr.
- Perdemos coisas maravilhosas por conta disso.
- Eu sei. Mas também evitamos tragédias.
- Eu não sou uma catástrofe.
- Mas eu sou. Até mais.

sábado, 22 de novembro de 2014

NÃO TEM NINGUÉM EM CASA.

ele acabou de sair. disse que iria ali e voltava rapidinho. quando ele voltar, diz pra ele que eu estive aqui? digo. 
por que você não quer falar com ninguém? não sei, Clara. eu não sinto vontade de sair do meu quarto, entende? ah, Caio, eu entendo, mas... por que? isso tem a ver com aquela história do Lucas? também. é muita coisa. é aquilo tudo que eu já te disse. são todos esses meses acumulados no organismo. tem uma hora que a gente precisa colocar pra fora e não sabe como. nem tudo nessa vida se resolve chorando. eu tento me manter ocupado, pelo menos. eu estudo. eu vejo um filme. eu leio um pedaço de um livro. faço brigadeiro. peço uma pizza. escrevo no meu blog. e converso com você. aliás, você é a única que me dá atenção, Clara. você não pega o celular no meio do meu desabafo, nem me interrompe enquanto processo aquilo que ainda não está pronto pra ser despejado. você não vira os olhos para os lados. você me vê. me ouve. me assiste. como se eu fosse o filme mais interessante que você já viu na vida. por que eles não podem ser como você? seu interesse pela minha vida. a forma como você me deixa deitar no seu colo. o apoio. todas coisas tão simples que ninguém dá mais de graça hoje em dia. tudo funciona como moeda de troca. e eu nunca ganho nada, Clara. nunca. sempre saio perdendo. esse ser humano que você vê na sua frente está perdendo feio pra vida. me diz, me diz, como eu faço pra virar o jogo ao meu favor? não quero ser esse cara ríspido que afasta todo mundo, mas esse mundo está tão superficial. lembra daquele meu encontro do mês passado? eu arrumei todos os livros, justamente pra ficarem bem escancarados. quando ele chegou, eu o acomodei e disse que poderia ver meus livros se quisesse, mas ele nem se mexeu. preferiu fazer qualquer coisa no celular. nossa, meus livros me entregam tanto. ele poderia ter evitado muita coisa se tivesse dado uma olhada nos títulos. ele veria que não valeria a pena ser filha da puta comigo. ele saberia que eu não merecia ser ignorado, ou que não era alguém em busca de sexo. Caio, você tem que ser paciente. mais? não é desespero, Clara, é raiva. o que eu faço de tão errado? qual o meu defeito? se as pessoas parassem pra me ouvir por alguns minutos. aceitassem meus convites. não sou nada daquilo que elas imaginam que eu seja. provavelmente sou melhor. eu não me acho, Clara. nunca pensei isso, Caio. eu penso justamente igual a ti. se eles te conhecessem como eu te conheço, quem estaria aqui não seria eu. 

Não seria eu. 

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Caixa postal.

Até que um dia você decidiu discar meu número. De tanto tocar caiu na caixa postal. No dia seguinte, quando acordei, haviam mais de dez chamadas não atendidas. Ignorei. Não sei, não faço a mínima ideia do que você queria me dizer, se é que teria mesmo algo de importante a ser dito. Eu lembro muito bem onde nós estávamos há duas semanas atrás. Deitados na cama, lado a lado, compartilhando histórias, experiências, por horas a fio. No dia seguinte, eu liguei, conforme havíamos combinado, você atendeu e disse que não podia falar naquele momento, que retornava mais tarde. O "mais tarde" durou vários dias sem dar sinal de vida. Até que eu larguei de mão. Ir atrás, ficar em cima, pra que? Por que? Se você não veio, é porque não queria vir e ponto final. Não tenho que ficar choramingando pelos cantos, a vida segue. Ah, e como segue. Você nem sabia, mas era a minha última tentativa. Aquela na qual eu apostei todas as fichas que me sobravam no bolso. "Só mais essa vez", disse a mim mesmo. Como alguém que tenta insistir, mesmo se esforçando ao máximo para permanecer de pé. Foi como uma partida de sinuca onde nenhuma bola caía. Foi um arremesso mal sucedido no boliche, onde eu acompanhei a bola ir rapidamente para à esquerda, deixando todos os pinos intactos. E eu que pensei que dessa vez seria diferente. Não foi. Só Deus sabe se um dia vai ser.

domingo, 19 de outubro de 2014

A DESCONHECIDA.

dia desses, eu estava sentado em um beco esperando minha vez de cortar o cabelo. na verdade, não tinha muito segredo, era só atravessar uma máquina quatro pela minha cabeça, vai e volta, vai e volta, e pronto. vou dificultar essa merda, pra que? pra parecer descolado? então, sentou do meu lado uma senhora. ela comia um milho com dificuldade, pois não tinha muitos dentes para ajuda-la na empreitada. como quem não quer nada, ela se virou pra mim e perguntou se eu queria. acho que foi a primeira vez que um estranho me ofereceu alguma coisa, sem que eu precisasse meter as mãos no bolso. recusei o milho, mas permaneci olhando para ela, de alguma forma eu sabia que ela queria dizer mais alguma coisa. e disse. contou que alguém tinha arranjado um lugar para ela morar, já que a própria filha a despejou de casa. segundo ela, a namorada da filha dela foi quem deu a ideia. continuou, dizendo que era maltratada, e realmente, a senhora tinha os olhos tristes. as mãos calejadas. a voz fraca. os cabelos um pouco desgrenhados, como se nada mais importasse. fiquei imaginando que essa era o retrato fiel de alguém que não é amado por ninguém, nem pela própria família. ainda que ela tivesse algum amante, não sei. fiquei imaginando em quantos lugares aquela mulher sentou, mas não recebeu atenção de ninguém a ponto de se sentir a vontade para conversar um pouco. ela só queria que alguém a olhasse nos olhos e a escutasse. poucas pessoas fazem isso hoje em dia. falo por mim, e agora falo por ela também. foi quase uma hora de conversa. de fraturas sendo, finalmente, expostas. mesmo que a um estranho. que, felizmente, não foi posto para fora de casa, mas que também carregava suas próprias dores. não me senti a vontade para contar dos meus problemas, depois de tanta coisa que a senhora havia dito. tenho a mania de guardar pra mim, coisas que não podem ser solucionadas por ninguém. tenho a mania de esconder as rachaduras com folhas de papel. tenho a mania, quase automática, de dizer que está tudo perfeitamente bem, quando por dentro, o castelo de cartas vai desmoronando vagarosamente. depois que a senhora saiu, com metade do seu milho ainda a ser comido, eu também quis sentar do lado de alguém e receber a atenção que eu havia acabado de dar. quer saber? deixa pra lá.

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Parece que foi ontem.


Parece que foi ontem que nós dois estávamos na mesma estação, esperando para pegarmos o mesmo trem. Parece que foi ontem que a gente dividiu uma uma travessa de brigadeiro, enquanto assistia algum filme francês qualquer. Parece que foi ontem que você dormiu enquanto conversávamos de madrugada no celular. Parece que foi ontem que eu pensava em te prometer o mundo, mas ficava calado. Já havia prometido a mim mesmo nunca mais prometer nada. Mas a gente planejava. Parece que foi ontem que nós imaginávamos a nossa casa. O nosso casamento. O ambiente. A decoração. Os convidados. O local. Parece que foi ontem que eu te presenteei com um livro e um urso de pelúcia. Parece que foi ontem que eu ganhei um travesseiro com um coração estampado nele. Parece que foi ontem que meu celular tocou e era você ligando só pra dizer que me amava um pouco mais do que há um minuto atrás. Parece que foi ontem. E foi. Hoje não é mais.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

SOCIEDADE. [+18]


Sempre pendi mais para o lado dos vilões, dos caras desajustados, desesperados, desalinhados, com a barba por fazer há meses, os dentes tortos, as calças largas e sujas nas pontas. Nunca fui com a cara dos mocinhos, dos sempre perfumados, cabelos cortados nas laterais, óculos de grau, mochila da Adidas, tênis da Puma e blusa da Calvin Klein. Caras assim não te surpreendem, não enfiam a mão entre as suas pernas a menos que você tenha que gritar. Os desleixados são granadas, explodem antes mesmo de você pensar em querer ficar aos mil pedaços. Também gosto das cadelas, das putas, das bêbadas, que usam meia-calça rasgada até a metade da coxa. Que deixam a maquiagem borrar e não vão ao banheiro para retocá-las. Que enchem o rabo de cachaça e reclamam da vida sem parar. Batem forte na mesa para chamar o garçom. Não usam e muito menos sabem o que é Instagram. Gosto de gente que manda os outros irem se foder, se eles tiverem mesmo que ir foderem. Às vezes uma boa foda salva um dia de merda, não é mesmo? Gosto dessas que metem a mão na sua calça por debaixo da mesa, enquanto a família inteira discute sobre política e conservadorismo. O olho contorcendo de prazer, e você diz: obrigado, a comida está deliciosa. Goza ali mesmo, na mão dela. Sempre pendi mais para o lado das putas, do que das santas. São mais parecidas comigo, tão imprestáveis quanto eu. Não gosto de regras, de leis, de religião, de ter que fazer aquilo que a sociedade espera. Não gosto de ser moldado por alguém. Eu quero ser moldado pelas minhas falhas, pelas minhas farras, pelas minhas fodas, pela minha sabedoria excêntrica. Por mim, não pelos outros.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Vai!


Vai, mas vai logo, vai antes que eu sinta sua falta. Vai antes que eu me meta na frente da porta e só saia quando ouvir a sirene da polícia tocando na beira da calçada. Pega tuas coisas, me promete que não vai esquecer nada. A pasta de dente, a escova de cabelo, as roupas, a última feira que ainda não foi colocada na geladeira, leva qualquer coisa que tenha teu nome, que me lembre que você exista. Vai, mas vai logo, vai antes que teu perfume comece a impregnar pela casa inteira. Só Deus sabe o trabalho que vou ter pra poder tirar o teu cheiro de tudo. Dos lençóis, das minhas roupas, da minha pele. Não esquece dos cds, dos presentes, é sério, eu não quero que fique nada. Aquela tua camisa que eu adoro vestir no final de semana, pode levar ela também. Enfia tudo na sua mala azul, nessa sua maldita mala azul e segue teu rumo. Encontra outro lugar pra morar bem longe de mim, e reza pra gente não se esbarrar por aí tão cedo. Me dá um tempinho até eu processar tudo. Me dá alguns segundos só pra eu cair na real. Não, não, alguns segundos não. Me dê alguns meses. Isso, meses. Vou precisar de meses até passar pelas quatro fases do término: enlouquecimento, ajuste forçado, pseudo superação e o tão esperado "quer saber? foda-se". E, se por acaso, o acaso for tão filho da puta quanto você e nos colocar na mesma calçada, indo em direções opostas, me faz um favor? Passa direto, finge que eu morri. Não me lança nenhum olhar de pena, ou simpatia, ou qualquer outro tipo de sentimento que eu vá provocar em você. Porque, a verdade mesmo, é que quando você sair, vai - de uma maneira ou de outra - levar ao óbito uma parte de mim.

ONDE NÓS ESTAMOS?

[para ler ouvindo: adam levine - lost stars]

encostei minha cabeça na beira da piscina. meio dia. o céu aberto. o sol brilhando intensamente lá em cima. coloquei qualquer música pra tocar e fiquei olhando as nuvens. alguns segundos depois, elas não estavam mais no mesmo lugar. tudo girava. rápido. desproporcionalmente. então eu acordei com o despertador tocando. você estava atrás de mim. me abraçando tão forte como se eu fosse um travesseiro. me desprendi vagarosamente para não te acordar. você se remexeu um pouco e depois voltou a dormir. fui andando até a cozinha para preparar o café. quinze minutos depois você acorda com o cheiro do café, provavelmente. a cara amassada. o cabelo desgrenhado. me dá um beijo de bom dia, pega o celular e começa a olhar as notícias do dia. coloca café na minha xícara, depois na sua. tem ovos mexidos. torradas. pão de queijo. iogurte. você pergunta o que eu quero fazer. e eu respondo que nós poderíamos ir até o parque fazer um piquenique. ir ao cinema depois. ou quem sabe, jantar em algum restaurante que ainda não fomos. ainda tem tantos. tem tanta coisa pra vermos ainda, afinal, faz só quinze dias desde que decidimos morar juntos. no parque, você me conta do relacionamento com os seus pais. sobre sua mãe não ser presente. sobre seu pai não te dar a atenção que você tanto precisou. sobre seu irmão ser o seu porto seguro. os seus melhores amigos. seu primeiro porre. a primeira garota que você ficou na vida. o primeiro cara que você namorou. o seu último namoro. os seus medos. seus objetivos. anoitecia, e a gente ainda tinha tanta coisa para ser dita. que seria dita mais tarde. nos levantamos, fomos caminhando. você contava sobre a cidade. eu ouvia atentamente. atentamente eu decorava cada movimento do seu rosto. o modo como sua boca se movia. a sua voz. o jeito como seu olhar ia e vinha por toda a avenida. os seus dentes. as suas mãos sempre gesticulando, como se complementassem toda a história. que estava sendo contada. a música acabou. abri os olhos. as nuvens estavam em outro lugar. você não estava lá do meu lado. meus olhos se encheram de lágrimas, lágrimas que hesitaram em querer transbordar pelo meu rosto. não tenho outra saída. o jeito é colocar outra música e continuar sonhando.

domingo, 14 de setembro de 2014

a pior pessoa do mundo.

não, eu não ligo se você caiu. eu não vou te ajudar a levantar. eu não vou te fazer um favor quando você mais precisar. eu vou deixar as plantas morrerem. eu vou jogar lixo na rua. vou tacar comida pelo ralo da pia. vou me encher de gordura saturada. entupir minhas veias. vou parar de fazer academia só pra foder com a minha saúde. não vou respeitar os idosos. as crianças. os deficientes. vou queimar os filmes que você me deu de presente. vou rasgar as cartas. vou dirigir em alta velocidade. vou ultrapassar o sinal vermelho. vou desrespeitar as leis de trânsito. as leis da vida. vou mandar os outros pro inferno. vou ser egoísta. vou fazer os outros se apaixonarem por mim, e em seguida dar o número errado. vou escrever poemas românticos e vou entregá-los. vou deixar os outros acharem que tudo aquilo que está escrito é verdade. vou ser egocêntrico. vou colocar pimenta na sua comida, mesmo sabendo que você tem alergia. eu vou ser a pior pessoa do mundo, só pra ver se você me liga, nem que seja pra me chamar de filho da puta.

sábado, 13 de setembro de 2014

RECIPROCIDADE.

[para ler ouvindo: milk & honey - arcade fire]



Como é a sensação de ter a pessoa mais importante do mundo entre os braços? Maravilhosa, eu diria. E a sensação da reciprocidade? De dar todo aquele amor e recebê-lo de volta? Sinceramente, eu não sei. Eu achava até ontem que já havia amado alguém, mas hoje não tenho tanta certeza. As pessoas escaparam de uma forma tão fácil, que eu duvido que se fosse amor mesmo eu teria deixado elas irem embora com tanta facilidade. Talvez eu já tenha sido o mundo para alguém, ou quem sabe um projeto de mundo. Dizer "Você é a pessoa que eu mais amo" é tão fácil quando ir lá e deixar um copo sujo na pia da cozinha. Usar as palavras, manobrar os verbos, sempre vai ser simples. Difícil é fazer isso através de um toque, de um beijo, de um abraço ou até mesmo um olhar. Eu queria imaginar minha vida sem alguém e não conseguir. Eu queria que alguém imaginasse a vida sem mim e não enxergasse futuro nenhum. Queria ser para alguém o mesmo que esse alguém é aqui dentro de mim. Queria sentir, pelo menos uma vez na vida, isso que as pessoas chamam de reciprocidade. Esse amor que você joga e volta feito bumerangue. Não com a mesma força que vai, é claro, mas na mesma sintonia. Cada um ama de um jeito diferente. Não quero alguém que me ame da mesma forma que eu amo, mas que esteja junto comigo, no mesmo lugar. Alguém que um dia não vá achar a estrada da direita mais interessante. Ou que a estrada da esquerda é mais liberal. Alguém que encontre em mim a gota de água que faltava para transbordar. Que me veja como um sinal de adição. Que acate os meus defeitos mais insuportáveis. Alguém que saiba equilibrar o relacionamento. Que não me sufoque, mas que não me deixe exageradamente livre. Que não seja ciumento, mas que me pergunte "quem era?" depois que eu desligar o telefone. Talvez o preço dessas exigências seja a solidão. Talvez a culpa seja dos filmes. Eu sei, a vida não é um romance hollywoodiano, mas reciprocidade não é ficção. Não é algo que só exista em roteiro de filme romântico. Deveria ser mais simples. Se fosse simples, não seria tão incrível, mas também não seria doloroso.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Fica?

[leia ouvindo: a canção que faltava - isabella taviani]

- Fica, fica aqui!
- Eu não posso, meu voo tá marcado pra amanhã.
- Mas... por que?
- Tem o meu trabalho, minha casa, minhas coisas... tudo está lá.
- Então trás pra cá.
- E o meu emprego? Vou viver de que?
- Eu... eu te emprego. Abro uma empresa só pra você. A gente monta uma sociedade.
- Com que dinheiro?
- É... verdade, eu não tenho tanto dinheiro assim. Talvez eu tenha que arrombar um caixa eletrônico.
- Você vai preso.
- Vou nada, se o guarda tentar me prender, eu olho bem pra ele e digo: Seu guarda, por favor, é por uma boa causa. Tá vendo essa pessoa aqui? - Aí eu mostro nossa foto, e continuo explicando. Eu sou exageradamente louco por ela. Fiz isso por amor. O senhor entende, não entende?
- Você vai preso.
- Ok, eu vou preso. Mas você tá seguindo meu raciocínio? Eu quero que você fique.
- Por que? A gente mal se conhece.
- Tenho a impressão que te conheço há muito tempo. Como se a gente junto fosse a coisa mais certa nesse mundo. O que eu posso fazer ou dizer pra te convencer disso?
- Tô mais do que convencido.
- Eu quero cuidar de ti. Eu sei que você tem essa pose de ser autossuficiente, mas tenho certeza absoluta que você quer ser cuidado, quer ser olhado, quer ser ajudado. Tu já arriscou outras vezes, saltou em outros mares desconhecidos. Por que não arriscar em mim? O que tu tens a perder?
- Teus argumentos são bem sólidos.
- Se você pudesse ver dentro de mim, você não pensaria duas vezes em ficar.
- João... João...
- Tanto tempo já passou desde a primeira vez que nos vimos, e olha aí... estamos aqui de novo. Nada é por acaso, sabia?
- Isso é verdade.
- Ontem eu vi dentro do teu olhar, a luz que eu buscava em tanta gente mas nunca encontrava.
- João?
- É uma música.
- Não, é que meu avião já vai decolar.



terça-feira, 26 de agosto de 2014

Você.

- Nossa...
- O que foi?
- Você.
- Eu? O que tem eu?
- É que...
- Fala, estou começando a ficar assustado.
- Não, não é pra assustar. É coisa boa. Você gosta de coisas boas, não gosta?
- Gosto. Anda, fala logo, você tá me enrolando.
- Estou não. O que eu quero dizer é que eu me sinto incrivelmente bem quando falo com você.
- Você poderia ter sido mais direto. Teria me assustado menos. Jurei que você iria dizer o contrário.
- Nunca. Se eu tirasse um dia de folga, eu gostaria de passa-lo inteirinho ouvindo você me contar suas histórias. Não tem nada que me deixe mais feliz do que isso.
- Isso o quê?
- Isso tudo. Nós dois.
- É engraçado, não é?
- Nós dois?
- Não. A vida. Me colocar no teu caminho e vice-versa.
- Vice-versa... Com a gente é vice-versa, não é?
- Claro que é.
- Eu sei. Tinha certeza que era.

-

- Tá tarde... eu tenho que ir.
- Mas já? Tá cedo.
- Não, já são mais de onze da noite. Amanhã a gente trabalha cedo.
- É. Que pena.
- Mas amanhã eu volto.
- Volta?
- Volto.
- Promete?
- Prometo!

domingo, 24 de agosto de 2014

Você está perdendo (meu) tempo.


Você está perdendo seu tempo.
E o meu.
Indo,
Voltando.
Sem se decidir se vai,
ou se fica.
Sem saber quem,
ou o que quer.
Sem saber se vira à esquerda,
ou à direita.
Você não quer nada.
Você não me quer.
Mas você não coloca as cartas na mesa.
Eu viro uma.
Esperança.
Quem espera sempre alcança.
Às vezes não.
Não vou esperar.
Não vou cruzar meus braços e esperar você se decidir.
Também não vou correr atrás de você,
mais uma vez,
apertar a campainha e dar de cara com ninguém.
De novo.
Porque você até chega a dizer: vem, vem aqui que eu preciso de você.
Aí eu chego, dirigindo o mais depressa possível, só para ouvir pelo interfone:
ele não está, acabou de sair.
Sendo assim, deixa que eu decido pela gente:
eu saio,
você fica.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Cara, você é tão ingênuo.


- É sério, eu pensei que ele queria algo de verdade.
- Ai, Caio... Você, às vezes, é tão ingênuo.
- O papo estava ótimo, na verdade, muito bom. Aí ele pediu uma foto.
- E você?
- Eu mandei. Eu mandei uma foto minha lendo meu livro predileto. Eu esperava que ele dissesse que era o livro predileto dele também, ou que fosse pedir emprestado.
- E ele?
- Ele não disse nada a respeito de mim, ou do livro.
- Depois disso ele não falou mais nada?
- Falou, Ana. Ele pediu uma foto minha sem roupa.
- Nossa!
- Pois é... Estou fadado a ser o fracassado dos relacionamentos.
- Calma andorinha, tua hora vai chegar.
- Vai nada. Eu fico com inveja de você com o Jorge. Não paro de olhar aquela foto das alianças que ele te deu quando vocês fizeram dois anos que já se conheciam. O buquê que ele mandou entregar no seu trabalho. Parece tão clichê... Talvez fosse há uns anos atrás, hoje isso é raro. Dar flores é uma coisa rara. Amar, amar de verdade, é raro. Você não sabe a sorte que tem, Ana.
- É verdade. Mas eu sei sim, Caio. Eu fico te vendo aí querendo alguém pra crescer contigo. Eu já estive na mesma situação que você, não te esquece disso.
- Já? Nem lembro disso, já faz tanto tempo. Eu sou muito ingênuo. Sempre espero o melhor dos outros. Sempre espero a ligação do dia seguinte. Sou tradicional. Quero jantares, filmes e passeios antes do primeiro beijo. Semanas e mais semanas antes da primeira transa. Quero me sentir a vontade com alguém, de uma forma que o silêncio não seja constrangedor. Essas coisas não existem mais. Pessoas assim não existem mais. Foram extintas, igual os dinossauros.
- Os valores estão mudando, Caio.
- Infelizmente, Ana. Sinto falta da época que pessoas não eram descartáveis.
- É... bons tempos!

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Borboletas?

- Ana, você está bem?
- Não, digo, não sei. Estou, eu acho. Por que pergunta?
- Nada, é que... você não tocou na comida.
- Eu estou sem fome. Na verdade, estou com fome mas estou pensando em mil coisas.
- Mil?
- Ok, uma.
- É o carinha da lanchonete?
- Não.
- É, não é?
- Ok, é.
- Ana, ana... você não disse que ia dar um tempo nos relacionamentos?
- Mas quem disse que estou em um relacionamento?
- Não disse que era um relacionamento sério, Ana. Mas a partir do momento que você está conhecendo alguém, podemos caracterizar isso como um relacionamento.
- Pareceu sério você falando dessa forma.
- Não precisa ser sério, precisa ser sincero. Concorda?
- Sim, claro. Bem... não cheguei a pensar nisso. Ok, pensei sim.
- E o que você pensou?
- Ah, sei lá, eu não me sentia bem assim há um tempinho.
- Nem com o Jorge?
- Não. Você sabe como esse relacionamento foi um tanto quanto desgastante.
- Eu sei.
- Pois é.
- É bom ver você assim. Parece feliz.
- Eu tô. Esse que é o problema. Não queria estar. Isso está me tirando o foco das coisas, e eu nem sei se é recíproco. Ontem eu passei lá pra dar um oi, puxei assunto e nada. Ele foi ríspido. Aí eu pensei que não iria dar em nada e fiquei na minha. Algumas horas depois ele liga dizendo que quer me ver. Você consegue entender isso?
- Sinceridade? Não, rs. Confesso até que deu um nó na minha cabeça.
- Eu fico esperando uma atitude devido os "sinais" que eu recebo, e daí acontece algo totalmente diferente.
- Que situação...
- Nem me fala.
- Mas... você acha que as borboletas voltaram?
- Talvez. E se voltaram, não creio que seja dessa vez que elas irão voar por muito tempo.
- Calma, Ana... calma.

sábado, 9 de agosto de 2014

Convites.

Acredito que não seja tão difícil arranjar alguém, quando se tem segundas intenções em mente. Pessoas pra uma noite só tem aos montes. Vamos beber? Talvez você acabem transando, talvez não. Agora, não tem nada que cheire mais a sexo do que um convite pra assistir um filme. Claro, não vamos generalizar. Mas é verdade, não é? E ainda tem aquelas pessoas que falam sem rodeios exatamente o que querem fazer. EU QUERO TRANSAR. Ok, entendi. A única dúvida que fica quando você sai de casa é: será que vai ser bom? Vai acontecer, e você já sabe previamente disso. Bem, longe de mim ver qualquer problema nisso. Se o corpo pede, e sua memória não vai te trazer nenhum remorso no dia seguinte, vá em frente. Mas, confesso: é muito mais interessante quando o convite não atiça a nossa imaginação e a gente fica com aquele nervosismo de principiante sem saber o que vai acontecer. Qualquer coisa que aconteça nessa noite vai ser totalmente inesperada. Assim como qualquer coisa que por ventura também não venha a se concretizar. Difícil, difícil mesmo é receber um convite pra dançar. É receber um convite sem qualquer conotação sexual. É ser chamado pra jantar em um restaurante, chegar meia hora antes só pra garantir que você não vai se atrasar. Um convite para comer um sanduíche na praça. Tomar um açaí. Um sorvete. Assistir um filme. E ASSISTI-LO. Debatê-lo ao final do mesmo. Raro é um convite desses não terminar na cama, ou quem sabe terminar na cama, mas com os dois virados de frente um pro outro contando intimidades que ninguém mais sabe. Ouvir da outra pessoa que é meio cedo e que vocês mal se conhecem. Perceber que por mais simples que seja a história que está sendo contada, os olhos da outra pessoa não desviam um só segundo dos seus. Melhor coisa do mundo é ir conhecendo o outro aos centímetros, deixar o desejo ir aumentando com o passar dos dias. Sem ânsia, como se o mundo pudesse acabar a qualquer minuto. Mas sabendo dosar, pra não parecer desinteressado. É... depois ninguém sabe por que eu só vivo dizendo não. 

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Surpresa!

Vai lá, ele é o cara da tua vida. Sério. Fala com ele. Nossa, olha lá, ele faz teu tipo, não faz? Vai fundo. Eu sinto, é ele. Só pode ser ele. Vira. Vira pra lá que ele acabou de virar pro lado de cá. Nossa, quase que ele te pega olhando pra ele. Já. Olha. Ele não tá olhando não. Sério. Viu? Ele tem as mesmas características que você descreveu pra mim há umas duas semanas atrás. Não é coincidência. É destino. Não é todo dia que a gente conhece o amor da nossa vida em um supermercado. Vai, fala com ele, por favor, por mim, não desperdiça isso porra, anda logo, ele vai já embora. Ele está indo no caminho do caixa, já era, esquece, não dá mais tempo. Droga. A mãe dele acabou de se aproximar. Vai ter que flertar com ele na frente dela. Vai assim mesmo. Calma, toma coragem. Pronto. Volta, volta, volta. Espera. Ele tá vindo sozinho. Ali. Ali, caramba, naquela direção, na sessão de produtos naturais. Eca, vocês se parecem mesmo. Parece que ele malha, você viu? Viu, viu sim. Agora é tua chance. Anda. E aí? E esse sorriso? Sério? Ele te deu o número dele? Ah, não. Você deu o número, então? Não disse que ia dar certo? Isso, pode gritar. Se não fosse eu na tua vida, teria perdido essa chance.

Foi mal. Não tenho culpa. É que... é que... ele me pareceu tão bom daquele ângulo. Tão... tão cheio de qualidades. A gente erra sabia, Caio? Vocês só se viram sete vezes durante quatro meses? Que horror! E foi ele quem te pediu em namoro? Jura? Ele? Não foi você? Às vezes você esquece das coisas. Tá. Desculpa, claro que acredito em ti. Que canalha! Mas eu jurava que era ele o cara certo pra ti. Nossa, essa de você pegar ele transando com outra pessoa é demais. Ainda disse que a culpa era sua? Bem, pelo menos ele inovou né. Brincadeira. É que geralmente a gente espera ouvir um pedido de desculpa. Deve ter sido horrível. É que de longe ele parecia um anjo. Se eu soubesse, juro pra ti, teria feito outra coisa... sei lá, mandado tocar fogo no supermercado com ele dentro, só pra você não ter que passar por isso. Mas você aprendeu alguma coisa, não aprendeu? É... a gente sempre aprende.

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Então é isso.



Você entra, calado, quieto, desconfiado, senta no canto do quarto. Eu te acompanho, calado, quieto, desconfiado, sento longe de você. Ninguém diz uma palavra. Ninguém abre a boca. Por cinco, dez, quinze minutos... Até que você resolve murmurar alguma coisa. Eu não entendo. Você aumenta o som da sua voz. Eu respondo que não, que não tenho nada a dizer. E eu não tinha. Eu sei. Você sabe. Era a coisa certa a se fazer. Eu não consegui ir atrás de você. Permaneci no mesmo lugar, imóvel, como se fingisse pra mim mesmo que nada daquilo estava acontecendo. Foi como se eu colocasse meu coração contra a parede e dissesse: não sinta nada. E eu não senti. Deixei que o trabalho, o estudo, todas as responsabilidades controlassem a minha vida, de tal forma que não fosse possível pensar em mais nada. Talvez assim fosse mais fácil. E foi. Vinha sendo. De repente, foi como se a ficha tivesse caído, entende? Faz sentido, porque eu ainda não tinha me permitido derramar uma lágrima sequer. Acho que por receio de não querer parecer fraco pra mim mesmo. Por mais que eu saiba e tenha certeza, que era assim que tinha que ser, mesmo assim, mesmo com toda essa aceitação, ainda dói. E dói pra caramba. Como se alguém espremesse todos os meus órgãos, um por um e bem lentamente. Toda despedida é dolorosa. Todo rompimento é difícil. É ainda pior porque você se vê só. De novo. Olha em volta e não vê mais nada. Ninguém. É como se você acordasse no dia seguinte em um lugar totalmente diferente, sem saber como foi parar lá. Mas é a mesma cama, a mesma vidraça, a mesma janela, o mesmo lençol. Não, não é a mesma coisa. Não é a mesma vida. Não é a mesma rotina. É tudo completamente diferente. Você é outra pessoa. Eu sou outra pessoa. Não somos dois estranhos, mas não somos mais o que éramos ontem. E sabe o que mais me assusta nesse mundo novo? É que eu me sinto inseguro, de novo.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Não diga nada.

Foi uma das frases que mais martelaram a minha cabeça nesses últimos dias. Quando, afinal, eu devo abrir a boca? Enfim, quando cheguei para trabalhar hoje, segunda-feira, haviam deixado um recado na minha mesa, que dizia: venha até a minha sala assim que chegar, Eduardo. Eduardo era meu chefe. Não só meu chefe, Eduardo era a pessoa por quem eu nutria um amor do qual ele nunca foi capaz de desconfiar. Parecia que estava caminhando para a guilhotina, e foi mais ou menos isso mesmo. A empresa estava precisando fazer cortes, e cortes justamente na área de criação. Para o meu azar, só haviam duas pessoas na criação. Eu e Clara. Clara era a atual namorada de Eduardo. Perguntei-me se não deveria dizer tudo o que sentia esses anos todos e me livrar logo desse peso, afinal, o que poderia acontecer? Eu estaria fora dali de qualquer jeito. Não veria o Eduardo tão cedo. E eu poderia seguir em frente, estar livre para me apaixonar de novo. Quem sabe dar uma chance pro Jorge, o meu vizinho que escuta MPB o dia todo e já me chamou pra jantar dezenas de vezes. Tão insistente investindo em mim, mesmo quando eu já não pareço alguém com quem outra pessoa gostaria de estar. Ana, Ana. Ana, você está me ouvindo? Sim, estou, respondi. Eduardo, já que eu não vou voltar aqui amanhã, tem uma coisa que você precisa saber. Eu te amei. Eu te amei desde o momento que a gente se cruzou ali naquele corredor. Eu nunca comentei com ninguém, e nunca me aproximei porque eu temia que seria impossível separar o trabalho da vida pessoal. Eu temi que as pessoas comentassem. Eu não gosto que falem mal de mim pelas costas. Mas hoje eu sei que não importa as medidas que eu tome, sempre vai existir alguém insatisfeito com a própria vida, que vai se achar no direito de comentar com outras pessoas que o que eu ando fazendo comigo mesma é algo errado. Talvez se eu me preocupasse menos com o que os outros pensam, eu teria vindo aqui antes por conta própria. Devo ter perdido tanto na vida por isso. Sempre com medo de desapontar meia dúzia de pessoas egoístas que eu nem sequer gosto. Que estranho, não é? Ana, eu perguntei se você tem alguma coisa a dizer. Quer saber? Não, tudo que eu queria dizer já foi dito. Mas você não disse nada, Ana. Exatamente. Quando você não tem algo de bom a ser dito, é melhor ficar em silêncio. Tchau, Eduardo. 

Até mais!